Art. 96. A arguição de suspeição precederá a qualquer outra, salvo quando fundada em motivo superveniente.
Abstenção, exceção e a precedência da suspeição
Abstenção e exceção: O termo abstenção não tem sido utilizado pela doutrina. E menos ainda pela jurisprudência. Um dos poucos processualistas que faz uso dele é Renato Marcão. É uma expressão bastante apropriada. O juiz que espontaneamente reconhece sua suspeição está se abstendo. Perceba-se, não se trata de criação do processualista penal – e bem que poderia ser, pois inteligência e criatividade é que não faltam à Renato Marcão –, o CPP no artigo 112 refere esse termo: “(…) Se não se der a abstenção, a incompatibilidade ou impedimento poderá ser arguido pelas partes (…)”. Curiosamente, é a única vez que o CPP utiliza a palavra abstenção. É uma expressão adequada, pois que significa renúncia, recusa, repúdio. Havendo suspeição do juiz, e ausente a abstenção, cabível a interposição pela parte da exceção de suspeição.
A arguição de suspeição precede a qualquer outra: As exceções referidas pelo artigo 95 são todas interpostas, estando presentes suas respectivas causas, ao mesmo tempo. Melhor explicando, o que esse artigo 96 quer significar não é que primeiro se argui a suspeição e depois as demais. O que quer dizer é que primeiro se julga, se decide, a arguição de suspeição, caso outras tenham sido interpostas concomitantemente. Exemplificando, tendo sido interpostas exceções de incompetência e de suspeição, primeiro deve ser julgada a suspeição, não o inverso. E a razão disso está em que não faz o menor sentido gastar tempo, dinheiro e Kbytes (não mais papel) para processar e julgar a exceção de incompetência, para depois, adiante, anular todo o procedimento com o reconhecimento da suspeição. Sendo preciso, só um juiz insuspeito pode julgar as demais exceções.
Suspeição, impedimento e motivo de foro íntimo
Suspeição e impedimento: Os casos de suspeição encontram-se descritos no artigo 254 do CPP. Os de impedimento, nos artigos 252 e 253. O que distingue uns dos outros é que, nas hipóteses de suspeição, é presumido o interesse do juiz relacionado com a parte, e, nas de impedimento, o interesse está associado à causa. Tanto as causas de suspeição como as de impedimento admitem a analogia e a interpretação extensiva (ver subtítulo Não taxatividade no título Impedimento do juiz, em comentários ao artigo 252). A exceção de impedimento segue as mesmas regras procedimentais da exceção de suspeição (artigo 112).
Motivo de foro íntimo: O juiz pode, também, dar-se por suspeito por motivo íntimo. Ver subtítulo Motivo de foro íntimo no título Suspeição do juiz, em comentários ao artigo 254.
Doutrina
Adriano Gouveia Lima: A quebra da imparcialidade como fundamento para exceção de suspeição. Âmbito Jurídico
Afrânio Silva Jardim: Sistema processual acusatório, imparcialidade dos juízes e Estado de Direito. Reflexões. . Empório do direito.
Jurisprudência
Contato de circunstância no processo civil ou administrativo não impede juiz de atuar no processo penal: O julgador do processo penal – mesmo que tenha tido contato com provas ou analisado a circunstância sob a perspectiva do processo administrativo ou civil – não está contaminado para efetuar análise jurisdicional posterior, na qual será aplicado outro arcabouço jurídico com ampla defesa e contraditório (HC 120.017/SP, rel. min. Dias Toffoli, julgado em 27-5-2014, acórdão publicado no DJE de 8-8-2014 – Informativo 748, Primeira Turma).
Comprometimento da isenção e da imparcialidade no exercício da judicatura configuram justa causa para o afastamento cautelar de magistrado: O conjunto de elementos que demostram o comprometimento da isenção e da imparcialidade no exercício da judicatura e evidenciam práticas com ela incompatíveis configura justa causa para o afastamento cautelar de magistrado do exercício de suas funções (MS 32.721/DF, rel. min. Cármen Lúcia, julgado em 11-11-2014, acórdão publicado no DJE de 11-2-2015 – Informativo 767, Segunda Turma).
Eventuais nulidades ocorridas em Plenário do Júri, decorrentes de impedimento ou suspeição de jurados, devem ser arguidas no momento oportuno, sob pena de preclusão. Fonte: jurisprudência em teses (STJ).
Acórdãos:
HC 208900/SP, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 11/10/2016, DJE 08/11/2016
AgRg no REsp 1366851/MG, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, julgado em 04/10/2016, DJE 17/10/2016
HC 342821/RO, Rel. Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, julgado em 15/03/2016, DJE 01/04/2016
AgRg no REsp 1500980/RS, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 17/03/2015, DJE 24/03/2015
HC 139835/SP, Rel. Ministro Campos Marques (Desembargador convocado do TJ/PR), Quinta Turma, julgado em 27/08/2013, DJE 02/09/2013
HC 167133/SC, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, julgado em 27/09/2011, DJE 28/10/2011
Firmeza do juiz e quebra da imparcialidade: A condução do interrogatório do réu de forma firme durante o júri não importa, necessariamente, em quebra da imparcialidade do magistrado e em influência negativa nos jurados (HC 410.161-PR, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, por unanimidade, julgado em 17/04/2018, DJe 27/04/2018 – Informativo 625).
Suspeição e caracterização da inimizade capital: A causa de suspeição atinente à inimizade capital em relação a uma das partes (artigo 254 c/c 258, ambos do Código de Processo Penal) não se perfaz com mera alegação de animosidade, exigindo-se indicação da plausibilidade de que o agente atua movido por razões de ódio, rancor ou vingança (AS 89 AgR, rel. min. Edson Fachin, DJE de 1º-2-2019).
Suspeição associada ao aconselhamento: A hipótese de suspeição associada ao aconselhamento de alguma das partes (artigo 254 c/c 258, ambos do CPP), além de pressupor que o agente público revele sua posição acerca do objeto de eventual demanda, desafia a participação pessoal daquele que se aponta como suspeito (AS 89 AgR, rel. min. Edson Fachin, DJE de 1º-2-2019).