Código de Processo Penal Comentado | Flavio Meirelles Medeiros

Artigo 158º-A – Cadeia de custódia. Conceitos gerais.

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 Art. 158-A. Considera-se cadeia de custódia o conjunto de todos os procedimentos utilizados para manter e documentar a história cronológica do vestígio coletado em locais ou em vítimas de crimes, para rastrear sua posse e manuseio a partir de seu reconhecimento até o descarte.  (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)   (Vigência)

§ 1º O início da cadeia de custódia dá-se com a preservação do local de crime ou com procedimentos policiais ou periciais nos quais seja detectada a existência de vestígio. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)  (Vigência)

§ 2º O agente público que reconhecer um elemento como de potencial interesse para a produção da prova pericial fica responsável por sua preservação. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)  (Vigência)

§ 3º Vestígio é todo objeto ou material bruto, visível ou latente, constatado ou recolhido, que se relaciona à infração penal. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) (Vigência)

Cadeia de custódia da prova, sua quebra e consequência

A cadeia de custódia da prova: Cadeia de custódia da prova é a lógica da sucessão de obtenção das provas e indícios do delito e sua autoria. É o encadeamento das provas, desde as primeiras até as últimas. Se, examinando as provas de uma investigação, não é possível reconhecer o que deu origem a que, ou seja, não é possível entender qual a sucessão lógica de colheita de provas que conduziu à solução do delito, há quebra da cadeia de custódia. A investigação, com essa ruptura lógica, perde sua confiabilidade. É aceitável a crença nos deuses, mas não que eles interfiram nas investigações. Ela é toda executada pelo investigador que, passo a passo, esclarece o delito. Se esses passos não deixam pegadas, fica faltando conexão lógica, e onde falta lógica ausenta-se a idoneidade dos elementos de prova.

Quebra da cadeia de custódia da prova: Dando exemplo. Luiz testemunhou na polícia que viu Carlos (vítima) morto e ensanguentado na estrada. Luiz (testemunha) correu até a casa de Maria (esposa da vítima), esposa de Carlos. Na casa de Maria, Luiz viu Fernando (amante de Maria). Viu também pequenas manchas de sangue em cima da mesa. Luiz (testemunha) contou que Carlos (vítima) tinha ciúmes de Fernando (amante de Maria) em relação a sua esposa Maria. A polícia realiza diligência de busca e apreensão na residência de Fernando (amante de Maria). Encontra manchas de sangue. Submetidas a perícia, o sangue é de Carlos (vítima). A polícia conclui que Fernando (amante de Maria) matou Carlos. Nesse exemplo encontra-se presente a cadeia de custódia. Tendo em vista o depoimento de Luiz, a polícia suspeitou de Fernando, e diligenciou em sua residência, onde encontrou sangue da vítima. Se for retirado dessa narrativa o depoimento de Luiz, há quebra da cadeia de custódia. Fica-se sem saber qual a razão que levou a polícia a diligenciar na residência de Fernando. Fica reduzido o valor probatório da tese de que foi Fernando quem matou Carlos. Se uma residência é invadida por policiais e lá é encontrado produto de crime, é preciso esclarecer o que levou os policiais a adentrar na residência. Sem esse esclarecimento, há quebra da cadeia de prova. Sem explicação para a invasão, fica difícil de crer na legalidade dessa ação. Ou houve emprego de prova ilícita ou, quem sabe, a ação foi resultado de uma desavença entre um policial e o dono da casa, ou qualquer outra explicação. Falta encadeamento. Falta lógica na sucessão de fatos. Há quebra na cadeia de prova. E, no caso, diante da absoluta falta de motivação para a invasão de domicilio, presente está também a prova ilícita. A prova é, por consequência, nula. E nulas também todas as demais provas que dela derivarem. Há quebra da cadeia de prova quando ocorre fragmentação ou interrupção da lógica da sucessão das provas. Quando não se sabe como foi obtido um determinado conjunto de conhecimentos revelados pela investigação. Os indícios e provas que fazem parte da cadeia de custódia são todos aqueles que forem relevantes ao esclarecimento do delito. Não são limitados, consequentemente, aos vestígios. Os vestígios são posteriores ao delito, os indícios podem ser tanto anteriores como posteriores.

Cadeia de custódia de vestígios: Vestígio, do latim, vestigium, significa planta do pé, pegada. São as marcas ou registros do ato que permanecem para o futuro. Projetando-se no futuro, prestam-se para reconstituir o passado. Documentos, objetos, instrumentos, corpo do delito, fotografias, filmagens, gravações de áudio, material biológico, tudo isso pode constituir vestígios de delito. O juiz é historiador. Precisa, para reconstruir o passado, conhecer não apenas as consequências materiais e palpáveis dos delitos, mas também de todos os indícios que levaram a seu esclarecimento, sejam eles materiais ou imateriais, anteriores ou posteriores ao fato. O artigo 158-A não trata da cadeia de prova. Regula parte dela, a cadeia dos vestígios materiais. Considera cadeia de custódia (o dispositivo não se utiliza da expressão cadeia de prova, pois cadeia de prova é mais do que cadeia de custódia) o conjunto de todos os procedimentos utilizados para manter e documentar a história cronológica do vestígio coletado em locais ou em vítimas de crimes. Define, no parágrafo 3º, vestígio como todo objeto ou material bruto, visível ou latente, constatado ou recolhido. Assim, a cadeia de custódia tratada no presente dispositivo é espécie da qual é gênero a cadeia de prova. O dispositivo e os demais sucessivos regulam, basicamente, a coleta e o armazenamento dos vestígios. A cadeia de prova diz respeito a todos os indícios e provas, inclusive os vestígios. O testemunho, o reconhecimento, a confissão, as medidas invasivas e de interceptação, a infiltração de policial, o conteúdo da interceptação, os documentos, as perícias, entre outros atos e fatos, fazem parte da cadeia de prova. A cadeia é a sequência, o encadeamento dessas provas e indícios.

Consequências da quebra da cadeia da prova: Presente a quebra da cadeia da prova, qual a consequência? Depende. A primeira consequência é a perda do valor probatório do acervo indiciário. Perda de valor probatório não significa que a prova valha nada. Significa apenas redução do valor da prova. Essa redução vai de zero a dez. Depende das circunstâncias do caso concreto. A segunda, mais drástica, é quando há indícios suficientes (materiais ou imateriais e por dedução ou indução) autorizadores do convencimento de que foi feito uso de meios ilícitos para a obtenção de provas. Neste caso, a consequência é reconhecer a nulidade de todas as provas resultantes da prova faltante (da prova ilícita). Feito isso, restará o exame se o que sobrou da investigação ainda configura, ou não, justa causa para a ação. Abatida a justa causa, a ação, se proposta, deve ser extinta.

Sobre prova ilícita: Ver título Distinguindo prova ilícita de nulidade em comentários ao artigo 157.

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