Código de Processo Penal Comentado | Flavio Meirelles Medeiros

Artigo 108º CPP – Exceção de incompetência.

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Art. 108. A exceção de incompetência do juízo poderá ser oposta, verbalmente ou por escrito, no prazo de defesa.
§ 1o Se, ouvido o Ministério Público, for aceita a declinatória, o feito será remetido ao juízo competente, onde, ratificados os atos anteriores, o processo prosseguirá.
§ 2o Recusada a incompetência, o juiz continuará no feito, fazendo tomar por termo a declinatória, se formulada verbalmente.

Competência absoluta e relativa

Competência absoluta: A competência absoluta se apresenta quando se reparte a jurisdição, ou em razão da matéria, ou por prerrogativa de função. Ela não admite prorrogação. A nulidade decorrente da incompetência absoluta independe de arguição oportuna, podendo ser reconhecida, até mesmo após o trânsito em julgado da sentença, inclusive por meio de habeas corpus. É que a competência constitui ato essencial, estrutural do processo, cuja falta implica nulidade absoluta, de prejuízo presumido (ver comentários ao artigo 564, inciso I). Ver também título Competência absoluta, competência relativa e prorrogação de competência em comentários ao artigo 69.

Competência relativa: A competência relativa é prorrogável, isto é, pode ser prolongada se não houver arguição oportuna. A competência relativa verifica-se normalmente quando se considera o lugar da infração, o domicílio do acusado, a natureza da infração quando relacionada com determinações de leis de organização judiciária, a distribuição, a conexão ou continência e a prevenção. A Súmula 33 do STJ  diz que a incompetência relativa não pode ser declarada de ofício. Esta Súmula foi criada, e vale, para o processo civil. Não para o penal. No processo penal, vige a norma do artigo 110, a qual determina que, se em qualquer fase do processo o juiz reconhecer motivo que o torne incompetente, deve declarar nos autos, haja ou não alegação da parte. De considerar-se que, no caso de prorrogação da competência relativa por falta de arguição oportuna, se o juiz verificar que a jurisdição prorrogada está prejudicando a parte, pode dar-se por incompetente. Nesse caso, importante que o faça o quanto antes, evitando a perda de tempo e a prática de atos processuais que serão inutilizados.

Legitimidade e arguição pelas partes

Legitimidade: A legitimidade para excepcionar a incompetência (declinatoria fori) é do MP, assistente da acusação, acusado, querelante e querelado. O artigo 271 dispõe que ao assistente da acusação é permitido propor meios de prova, requerer perguntas às testemunhas, aditar o libelo e os articulados, participar do debate oral e arrazoar os recursos interpostos pelo Ministério Público, ou por ele próprio, nos casos dos artigos 584, § 1o, e 598. Esse rol de atos não é exaustivo, pois não se pode exigir que em apenas um dispositivo do Código o legislador enumere todos os atos processuais que podem ser praticados pelo assistente. Caso se exigisse, seria um dispositivo extremamente extenso. A toda evidência, o artigo 271 é exemplificativo. 

Arguição pela defesa: Oferecida e recebida a denúncia ou queixa, o juiz ordena a citação do acusado para responder à acusação por escrito no prazo de dez dias. Na resposta, o acusado deve alegar tudo o que interesse à sua defesa e indicar provas. Essa resposta, embora ainda não haja consenso, chama-se defesa prévia. A exceção de incompetência deve ser apresentada nesse momento, mas em apartado, em petição própria. É o que diz o parágrafo primeiro do artigo 396-AA exceção será processada em apartado, nos termos dos arts. 95 a 112 deste Código. O artigo 111 repete o mesmo comando ao dizer que as exceções serão processadas em autos apartados e não suspenderão, em regra, o andamento da ação penal.

Arguição pela acusação: Deve ser realizada por peça em separado, acompanhando a denúncia ou queixa. A exceção será processada em apartado. Em regra, não suspende a ação penal. 

Recursos, ações e preliminar de apelação

Recursos, ações e preliminar: Contra a decisão do juiz que reconhece a incompetência, de ofício ou atendendo simples pedido da parte, cabe recurso em sentido estrito com fundamento no artigo 581, inciso II. Para impugnar decisão judicial que julga procedente exceção de incompetência, o recurso adequado também é o em sentido estrito, só que com fundamento no artigo 581, inciso III. Não há previsão de recurso contra a decisão que mantém a competência. Nesta hipótese, podem ser utilizadas as ações de habeas corpus e de mandado de segurança. Pode, ainda, ser arguida em preliminar de apelação a nulidade do processo por incompetência do juízo.

Conflito negativo, ratificação, nulidade de atos e prescrição

Conflito negativo de competência: Reconhecida a incompetência, o juiz ao qual são remetidos os autos pode entender que também não é competente. Nesse caso, esse magistrado poderá suscitar o conflito negativo de competência (artigo 114, inciso I c/c artigo 115, inciso III).

Ratificação e declaração de nulidade de atos: O presente dispositivo diz que o feito será remetido ao juízo competente onde, ratificados os atos anteriores, o processo prosseguirá. O artigo 567 esclarece que a incompetência do juízo anula somente os atos decisórios, devendo o processo, quando for declarada a nulidade, ser remetido ao juiz competente. O artigo 573 e seus parágrafos prescrevem que os atos, cuja nulidade não tiver sido sanada, na forma dos artigos anteriores, serão renovados ou retificados. A nulidade de um ato, uma vez declarada, causará a dos atos que dele diretamente dependam ou sejam consequência. O juiz que pronunciar a nulidade declarará os atos a que ela se estende. Vamos simplificar. Primeira questão: quem decide o que é nulo e o que não é nulo no processo, o juiz que se declara incompetente ou o que recebe os autos? Respondendo, é o juiz que recebe os autos. É este quem passará a presidir e administrar o processo. É quem sabe da estratégia que dará à tramitação procedimental. O parágrafo 2º do artigo 573 não pode ser levado ao pé da letra. Quando o tribunal declara a nulidade de um processo em sede de apelação, deixa, normalmente, ao juiz de 1ª instância a decisão a propósito de quais os “os atos a que ela se estende”. Ou seja, os Tribunais não aplicam a literalidade do parágrafo 2º do artigo 573. Além do mais, o presente artigo 108 determina que o feito seja remetido ao juízo competente, onde, ratificados os atos anteriores, o processo prosseguirá. Portanto, é o juízo competente quem ratificará os atos anteriores e reconhecerá a nulidade dos inaproveitáveis. Se o processo chegar de juiz absolutamente incompetente, todos seus atos são imprestáveis, os decisórios e os instrutórios. A incompetência absoluta, uma vez reconhecida, e remetidos os autos ao juiz competente, ele terá de renovar todos os atos do processo, não só os decisórios, como também os instrutórios, pois, na espécie, os atos do processo anulado são juridicamente inexistentes. Já em se tratando de incompetência relativa, somente os atos decisórios são nulos. Porém, todos os atos que forem consequência dessas deliberações deverão ser anulados e refeitos (parágrafos 1º e 2º do artigo 573). Os demais atos poderão ser ratificados (confirmados). 

Recebimento da denúncia e interrupção da prescrição: O recebimento da denúncia constitui ato decisório. Reconhecida a incompetência, o recebimento da denúncia realizado por juiz incompetente não produz o efeito de interromper o curso da prescrição (artigo 117, inciso I do CP).

Fim

4 respostas

  1. Se for nulidade relativa o juiz que recebe o processo refaz o ato decisório e os instrutórios vai analisar de ratifica ou não.
    Se for nulidade absoluta como em razão da matéria ou função os atos são nulos, não cabendo ratificar nada, pois os atos instrutórios e decisórios são vistos como inexistentes, certo?

    1. A incompetência do juízo (relativa) anula somente os atos decisórios. Há entendimento jurisprudencial no sentido que não anula o recebimento da denúncia, que pode ser ratificado pelo juiz competente, persistindo válida a interrupção da prescrição. Já se a incompetência for absoluta, o recebimento da denúncia do processo nulo não produz o efeito de interrupção do prazo prescricional.

      1. Então deixa ver se fechou o raciocínio, o juízo (relativa) competente vai ter a faculdade de verificar se considera a denuncia recebida ou não?
        Se o juízo competente fazer opção por não interromper a prescrição não se pode fazer nada?

        1. 1 – Reconhecida a nulidade por incompetência relativa, a jurisprudência majoritária considera que o recebimento da denúncia feito pelo juiz incompetente é válido para fins de interrupção da prescrição.
          2 – o juiz competente poderá confirmar ou não o recebimento da denúncia feito pelo juiz incompetente relativamente. Se ratificar, há, segundo a jurisprudência (contra o que penso), interrupção da prescrição.
          3 – contra o não recebimento da denúncia cabe recurso em sentido estrito (art. 581, I).Contra a interrupção da prescrição cabe, em tese, habeas corpus.

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